A cada nova geração de videogames, diversas desenvolvedoras de jogos buscam explorar os limites técnicos dos hardwares e explorar a experiência mais avançada graficamente possível, numa corrida por gráficos fotorrealistas cujo salto visual entre uma geração e outra é cada vez mais tímido. A Nintendo, por sua vez, ousou trilhar um caminho diferente e colheu frutos com o do Nintendo Switch, apostando na experiência do usuário final, priorizando diversão a gráficos de ponta, e na versatilidade do console híbrido.
No entanto, em meio a jogos de sucesso em gêneros como e que costumam exigir mais dos hardwares de consoles e PCs, como ação e aventura, RPG, plataforma e roguelikes, os card games, que em essência transportam para o ambiente digital a lógica de gameplay já presente em jogos físicos de cartas, têm ocupado um lugar de destaque no gosto do público, com títulos como Pokémon TCG Pocket, Balatro e Marvel Snap ocupando lugares de destaque na indústria nos últimos anos.
Embora esta onda de sucesso nos games tenha sido iniciada muitos anos atras, quando Hearthstone, de 2014, se tornou uma febre no mercado de jogos mobile e deu início a uma primeira onda de sucessos, a indústria de games vive hoje uma espécie de segunda onda de sucessos, pois além TCG Pocket, Marvel Snap e Balatro, jogos como Inscryption e Yu-Gi-Oh: Master Duel são parte dessa nova crescente de popularidade do gênero, mesmo com propostas e jogabilidades bem distintas entre si. Todos esses títulos, porém, têm características em comum que ajudam a explicar esse sucesso.
Acessibilidade financeira e técnica
Um dos fatores que mais ajudam a explicar o sucesso desses jogos é acessibilidade, seja financeira ou técnica. Enquanto títulos como Pokémon TCG Pocket e Marvel Snap adotam um modelo de jogo gratuito com microtransações, mas sem que isso seja um impeditivo que jogadores que não gastam dinheiro possam competir nas disputas online contra aqueles que investem dinheiro no jogo. Obviamente, a parcela de jogadores que investem monetariamente nesses títulos tem completam mais rápido suas coleções, mas jogadores que jogam diariamente, sem gastar dinheiro, são capazes de no mínimo, conseguir mais de 90% das cartas e competir nas disputas online e campeonatos de comunidade sem grande prejuízo.
No caso de games de construção de baralho como Balatro, Inscryption, Slay the Spire e o game brasileiro Astrea: Six-Sided Oracles, que adotam o modelo pago e são focados em uma campanha single-player, todos esses títulos são pagos, mas vendidos a preços acessíveis, com valores que vão de R$ 45 a R$ 75 no Steam e de R$ 75 a R$ 103 nos consoles, desconsiderando promoções, que tornam esses jogos ainda mais acessíveis. Por outro lado, esses games oferecem acesso a todo o conteúdo sem necessidade de microtransações, embora não tenham acesso a um multiplayer competitivo de forma oficial, apenas por meio de mods criados pela comunidade.
Já a acessibilidade técnica a esses títulos ocorre pelo fato de não ser necessário ter um console de última geração ou PC com placa de vídeo de ponta para jogá-los. Na verdade, quase todos eles podem ser jogados com fluidez técnica em qualquer celular intermediário atual ou até mesmo em smartphones de entrada, o que os torna muito mais acessíveis seja no mobile ou PC. Enquanto títulos de alto orçamento, os famosos AAA, exigem consoles atuais ou PCs com placas de vídeo dedicadas, Pokémon TCG Pocket, Marvel Snap, Balatro, Inscryption, Slay de Spire e Yu-Gi-Oh: Master Duel têm uma barreira de acesso muito mais baixa.
Além disso, em card games raramente é preciso se dedicar a sessões longuíssimas de gameplay, algo cada vez mais comum em jogos de campanha single-player de alto orçamento, que precisam “justificar” o próprio valor o cobrado. Esses títulos são, às veze, muito mais longos que o necessário sob o pretexto de oferecer “mais conteúdo”, ainda que esse conteúdo possa resultar em explorações de mapa sem muita recompensa e atividades secundárias repetitivas.
Jogos fáceis de aprender e que recompensam a estratégia
Uma das principais barreiras para pessoas ingressarem em jogos com algum aspecto competitivo é a exigência de alguma habilidade mecânica avançada para competir com outros jogadores. Isso vale para jogos de tiro como Counter-Strike 2, Valorant e Rainbow Six Siege, para MOBAs como League of Legends e Dota 2, games de futebol como EA Sports FC e eFootball ou jogos de luta como Street Fighter, Tekken, Mortal Kombat e Super Smash Bros.
Em maior ou menor nível, todos esses títulos exigem capacidade rápida de adaptação para reagir a situações de jogo e tempo de reação rápido para execução de comandos, além do entendimento estratégico do jogo em si. No caso dos card games, porém, em vez de habilidades mecânicas apuradas ou mãos rápidas para realizar comandos, o que realmente conta é a inteligência para entender as regras do jogo e capacidade de se adaptar aos diferentes cenários que se apresentam a cada nova rodada, pois em jogos de cartas a sorte (ou azar) sempre tem algum peso no resultado final das partidas.
Além disso, o próprio fator sorte traz emoção extra aos jogos, pois tirar a carta necessária no momento decisivo de um duelo muitas vezes é o que separa a vitória da derrota. Em Marvel Snap, por exemplo, os diferentes efeitos presentes em cada tabuleiro podem favorecer ou prejudicar a estratégia de um jogador e prejudicar a do outro, forçando que um deles se adapte e consiga reverter a desvantagem aproveitando da melhor forma possível as possibilidades que as cartas à mão oferecem.
Enquanto Hulk oferece força bruta e adiciona 12 pontos ao nosso lado do tabuleiro, sendo uma carta que funciona bem por si só, o Homem de Ferro dobra os pontos de todas as nossas cartas em um determinado tabuleiro, ou seja, é uma carta fraca sozinha ou quando associada apenas a cartas de pontuação baixa, mas pode mudar completamente o rumo de um jogo quando dobra o poder de cartas mais poderosas. Medusa, por outro lado, é uma carta que só realiza seu potencial máximo se a jogarmos no tabuleiro do meio, enquanto Jessica Jones tem seu poder aumentado de 4 para 9 caso não joguemos nenhuma carta em seu tabuleiro no turno seguinte. Cada uma dessas cartas pode ser mostar extremamente útil em combate, mas desde que saibamos utilizá-las e entender as possibilidades que nosso adversário pode explorar.
Em Pokémon TCG Pocket, cartas que dependem de jogarmos moedas, como Misty, Moltres EX, Celebi EX, Kingler ou Mismagius EX, muitas vezes mudam por completo o rumo de uma partida, mas ter um plano B para ter êxito na luta também é necessário. No caso de Misty, por exemplo, a líder de ginásio pode fornecer energias do tipo água cada vez que uma moeda cai no eixo cara, mas ela também não fornecer nenhuma energia caso caia coroa logo de cara.
No caso de monstrinhos como Blastoise EX, que precisa de 5 energias para causar 160 de dano com o ataque Bazuca D’água, se Misty não colaborar o ideal é ter pelo menos dois Pokémon que possam ficar como escudos enquanto acumulamos energias, e monstrinhos como Mewtwo básico ou Palkia Forma Origem, ambos com 120 de HP e cartas que não fazem parte de linhas evolutivas, são peças ideais para essa função. Além disso, TCG Pocket conta com diversos modificadores que podem mudar o rumo de uma luta, como itens que aumentam a vida máxima de um monstrinhos, treinadores que curam Pokémon e itens que causam dano ao Pokémon que realiza um ataque etc, e todas essas cartas podem ser o fiel da balança que separa uma vitória de uma derrota.
Diversão como fiel da balança e o valor do colecionismo
No fim, o fator mais importante de qualquer jogo é a capacidade de prender e divertir seu público-alvo, e a enorme variedade de gêneros existentes felizmente permite que diferentes perfis de jogadores sejam contemplados. Em tempos em que um único grande lançamento de Nintendo Switch, PlayStation 5 ou Xbox Series pode custar R$ 350,00, alternativas mais baratas não imprescindíveis, especialmente considerando as parcelas de jogadores que não têm um PC ou console de ponta.
Os card games virtuais se inserem justamente nesse contexto, pois ainda que alguns deles tenham microtransações caríssimas, como TCG Pocket e Marvel Snap, ainda é possível jogá-los por tempo intederminado e se divertir de forma gratuita. Além disso, muitos jogadores veem mais valor em coletar cartas raras do que em competir, e a recente febre do novo jogo de cartas de Pokémon é prova disso. Jogadores que abrem o título diariamente sempre têm a chance de abrir dois pacotes de booster por dia e, numa tacada de sorte, conseguir uma carta full art, imersiva ou cromada.
As chances são maiores para quem gasta com Poké Ouro e assina o Passe Premium, inclusive com acesso a recompensas exclusivas? Certamente, mas para aqueles que apenas buscam uma alternativa de diversão gratuita e que ofereça batalhas online e oportunidade de colecionar cartas, títulos como TCG Pocket, Marvel Snap, Yu-Gi-Oh: Master Duel e Legends of Runeterra ainda são um refúgio e uma alternativa a lançamentos cada vez mais caros.
Por outro lado, games pagos, mas sem microtransações, com preço justo e sem exigência de consoles ou PCs de ponta, como Inscryption, Balatro, Slay the Spire e Astrea: Six-Sided Oracles, conseguem oferecer uma aventura single-player com desafios constantes e constante sensação de recompensa a cada nova vitória. Embora nem todos os os game sejam acessíveis a todo tipo de público, ainda existem títulos capazes de oferecer muitas horas de diversão de forma gratuita ou com uma barreira monetária mais baixa, e nesse aspecto os card games virtuais são um dos maiores exemplos de sucesso dos últimos anos.
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Créditos Autor: Gabriel Sales
Créditos Imagens: Reprodução Internet
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